segunda-feira, 28 de abril de 2008

Deuses com pés de barro

Mário Jardel fez, este fim-de-semana, uma revelação que já não admira, dado o buraco negro em que caiu: o goleador brasileiro consumiu cocaína. Não se pode dizer que Super-Mário tenha tido o mundo a seus pés, mas pelo menos este jardim à beira-mar plantado rendeu-se por completo ao seu talento, e, aqui, era rei. Ganhou prémios atrás de prémios, recebia um ordenado chorudo e foi várias vezes campeão nacional. Por isso eu pergunto-me: como pode alguém endeusado desta forma cair em desgraça? É certo que quanto maior é o voo maior é a queda, mas o estrondo com que Jardel bateu no fundo parece ter tido um eco muito maior do que o seus gritos de vitória.
O brasileiro não é caso único; nem sequer o maior nome das quedas futebolísticas. Mas as estórias que o envolveram, ainda em Lisboa, quando se rodeara de verdadeiros amigos da onça, chocam o comum mortal que tantas vezes invejou a sorte dos senhores da bola. Ainda para mais, Jardel entrou neste caminho de perdição quando já tinha vasta experiência de sucesso, ao contrário de outros, como Maradona, que se envolveram na droga pouco depois dos primeiros sinais de sucesso. Então, o que correu mal? O sucesso subiu-lhe à cabeça? O empresário prometeu-lhe um contrato milionário com o Real Madrid ou o Barcelona? A pressão esmagou um Jardel frágil psicologicamente? Os falsos amigos que o rodeavam serão os únicos responsáveis?
Não é fácil encontrar uma resposta; talvez o que se tenha passado tenha sido reflexo de um pouco de tudo isto. O que é importante retirar desta estória, no entanto, é o exemplo que fica para os candidatos a estrelas que povoam muitos relvados de formação deste país. Que lhes sirva de exemplo de como o sucesso e a ribalta são coisas efémeras, que a idolatração não dura para sempre, e que para se manterem nessa posição de conforto não basta saber dar uns pontapés certeiros na redondinha; é preciso sobretudo saber manter a cabeça no sítio, e trabalhar da mesma forma, todos os dias, quer se esteja a preparar a final do Campeonato do Mundo ou um jogo treino contra uma equipa de amadores. Se fizerem isso, já têm meio caminho andado para o sucesso.

Um comentário:

LEÃO DA ESTRELA disse...

Aos 34 anos, dificilmente voltará a ser um campeão do futebol, mas ainda pode ser um campeão da vida se não voltar a cair na tentação do uso de drogas. Mário Jardel foi um dos melhores pontas-de-lança de sempre que passaram pelo futebol português.
No FC Porto e no Sporting, “Super-Mário”, como ficou conhecido, valia mais do que um golo por jogo, tal como outro grande goleador leonino, o inesquecível Fernando Peyroteo do tempo dos "Cinco Violinos". Em Alvalade, Jardel marcou um total de 67 golos em todas as competições, tendo sido decisivo para a conquista do último título nacional, em 2002, ano em que o Sporting também conquistou a Taça de Portugal e a Supertaça Cândido Oliveira. Só para a Liga de 2001-2002 contribuiu com 42 golos, ficando a quatro de igualar o recorde de outro sul-americano, o argentino Yazalde, que continua como o melhor marcador de sempre em campeonatos europeus, com 46 golos numa só temporada.
Em duas emporadas, Jardel conheceu a glória e a inglória. Da sua cabeça fatal saíram os golos que glorificaram o treinador romeno Lazlo Bolöni, mas também as infantilidades que infernizaram a vida de ambos, e que impediram o Sporting de disputar o título com o FC Porto, em 2002-2003, da primeira época de Mourinho. Agora, confessa que estava preso à maldita cocaína. Só não disse como chegou lá... Ao que parece, toda a gente sabia, mas só “Super-Mário” teve coragem de o revelar em público. O seu exemplo não pode ser desperdiçado.
O Ministério da Educação deveria estar atento e convidar Mário Jardel para uma campanha de sensibilização dirigida aos jovens portugueses. Uma campanha feita a partir de um exemplo concreto tem muito mais força. O próprio Sporting, como colectividade desportiva de utilidade pública que movimenta milhares e milhares de jovens na ocupação dos tempos livres e na promoção desportiva, até poderia assumir a iniciativa, propondo ao próprio Ministério da Educação um protocolo que possa financiá-la. Mário Jardel também poderia ir pelas escolas do País dar conta do seu exemplo, ajudando, assim, a prevenir a perda de outras vidas e de muitos sonhos de juventude. Só assim ganharia mais sentido a corajosa entrevista do antigo campeão do Sporting à "TV Globo".